segunda-feira, 22 de abril de 2013

Pseudosoneto de um verdadeiro adeus

Queria tanto rever-te,
que nem precisaria reverter.
O que passou se esvaiu,
sobrou a saudade agonizante.

Há dias no entardecer,
que mirando o horizonte,
me pego lembrando
o sol de anos atrás.

Não há clave de sol
que faça uma escala tão harmônica
como teus suspiros.

A única música que ouço por ora
é o silêncio da ausência
que eu mesmo compus.

sábado, 13 de abril de 2013

Morangos de mercado

Apesar de tão constante, nunca havia mensurado o poder que a ausência tem. A ausência não é neutra, deixa de ser apenas a não presença quando sabemos sua importância. Um filme negativo de uma foto em família, já não se reconhece quem é pai, filho, mãe,...

Estava sentado com minha ausência, habitual há tanto que até meus pensamentos ficam ausentes, mais do que invisível, me sentia inexistente por um tempo. Mas minha inexistência deixou de ser, quando um casal de crianças chegou perto. O menino tinha cerca de 5 anos, a menina 8. Ele pulava, corria, caía, conversava e brincava, tudo sozinho. Já sua irmã que ficava sentada ao lado da mãe, deixou seu posto apenas momentaneamente, e num breve instante assumiu seu papel de criança, rodou como uma bailarina na frente de uma vidraça e se admirou para poder elogiar-se mais tarde. Um instante tão breve como um feixe de luz que penetra as fenestras de uma caixa de madeira.

A ausência continuava no pai que deixou a família esperando na frente do restaurante e na mãe discutindo ao telefone. Nesse momento notei que nem mesmo o motivo mais nobre neutraliza o poder do não estar. Quando o telefone se desligou, e uma colocou a mão no ombro da outra perguntando se não havia problema jantar em outro lugar, eu vi uma película negativa, já não sabia quem era quem. Enquanto a mais velha chorava, a maior acalentava os braços que deveriam abraçá-la. 'Vamos para casa, encomendamos de lá', disse a maior, porém mais nova.

Minha primeira reação foi de admiração, mas logo veio um embrulho no estômago. Lembrei dos morangos de mercado que são colhidos precocemente e não tomam o sol da manhã ou apanham o sereno da madrugada, amadurecem dentro de caixas escuras num depósito. De cor vermelha viva, sua pele não possui qualquer machucado aparente, quase uma fruta de plástico; mas à primeira mordida: uma polpa branca, um gosto vazio. Um dia, a menina terá que desfrutar-se, que não tenha pulado o sereno da infância e caído na caixa escura da vida adulta. Que não viva essa amadurescência programada.

domingo, 7 de abril de 2013

Sujeito oculto


Ele não se conteve,
continha tudo.
Transbordava a qualquer gota
de lágrima ou felicidade;
Não retinha, dividia
cada sorriso e cada pranto
sem medo, em todos os cantos
espalhava seus pedaços
e suas miudezas
com uma grandiosa sinceridade.

A cada passo em falso
tropeço ou soluço,
uma mão se estendia
retribuindo um abraço passado.

Para cada amor,
uma infinitude a todo momento.
Um constante contentamento
com tudo que pudesse ser,
um domingo chuvoso,
um feriado no sábado,
uma segunda sem graça...
Tudo era felicidade.
Mesmo quando acabava,
a infinitude permanecia na tristeza,
mesmo nos momentos mais felizes.

Era um cara engraçado,
que mesmo na mais profunda tristeza,
só por sua presença
todos sorriam.

Era de um andar solitário
e um sorriso contagiante,
de ar aristocrático,
com um sentimento comum.
Era de uma forma disforme,
a presença inata da ausência.
Ele foi a contradição
que se contradisse,
um sujeito difícil de falar.